Stress: resposta fisiológica

José Santos // Novembro 22, 2016
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O corpo humano é uma máquina complexa. São inúmeros e muitos deles ainda desconhecidos, os mecanismos de regulação que são utilizados para manter um equilíbrio dinâmico, que proporcione o que em biologia se denomina de homeostasia. A “resposta fisiológica a algo desagradável” – o chamado stress – foi descoberta na década de 40 durante uma experiência com cobaias animais, em que se injetava diariamente dois grupos de ratos, um com uma substância hormonal e outro com apenas soro fisiológico. O investigador Hans Selye começou a verificar que os sintomas eram semelhantes em ambos os grupos e assim sendo, as causas não poderiam ser a substância, mas o facto de serem repetidamente traumatizados com a injeção. As experiências foram repetidas e confirmadas, inclusive com outro tipo de agressões repetidas, como temperaturas extremas, ambientes ruidosos e toxinas. Nestas situações o organismo reage com respostas bioquímicas complexas que visam minimizar a agressão. O problema é que se a agressão for mantida, muitas vezes estes mecanismos, que de início são protetores, podem pela persistência tornar-se eles próprios geradores de desequilíbrios e doença.

Estas respostas variam bastante de pessoa para pessoa e até variam ao longo do tempo para um mesmo individuo. As agressões puramente físicas, geram respostas mais semelhantes entre si. Por exemplo se sentimos dor/queimadura, todos retiramos a mão/parte do corpo afetada. Mas em relação a agressões mais psicológicas, as respostas variam bastante de uma pessoa para outra. A capacidade do individuo de se adaptar e atenuar a resposta a um determinado tipo de agressão/stress, é regulada e pode ser melhorada com estratégias que se denominam de coping ou adaptação.

Todas as respostas fisiológicas são integradas no nosso sistema nervoso central, nomeadamente numa zona específica do nosso cérebro, denominada de sistema límbico. Este sistema está altamente correlacionado com a parte emocional: medo, raiva, excitação entre outras emoções, que são interpretadas nesta região e influenciam as respostas do sistema endócrino (hormonas) e do sistema nervoso autonómico, que em conjunto formam o sistema de resposta ao stress. Sinais e sintomas clínicos como dores de cabeça, pescoço e ombros tensos, palpitações (coração acelerado), mãos frias e suadas, sensação de alterações da temperatura corporal ou aumento de infeções, podem refletir uma exposição crónica a estes mecanismos geradores de stress.

ESTES SINTOMAS NÃO SÃO PSICOLÓGICOS. São antes manifestações de um funcionamento alterado do nosso sistema nervoso autonómico/automático, a parte que regula a maior parte das nossas funções vitais, como o número de vezes que o nosso coração bate por minuto ou quantas vezes respiramos, a qualidade do nosso sono ou como e quando fazemos a digestão dos alimentos, entre outras funções primordiais que são afetadas e manifestam essas alterações com sensações muitas vezes subjetivas e difíceis de valorizar por nós e pelos médicos que nos acompanham. A verdade é que são reais e importantes.

Existe uma hormona que é hoje por demais conhecida e falada – o cortisol – a denominada hormona do stress. Esta hormona é segregada na nossa suprarrenal (um órgão que fica por cima de cada um dos nossos rins) e faz parte integrante da resposta ao stress. O sistema nervoso, através do hipotálamo, “dá ordem” à hipófise para segregar esta hormona que vai levar a suprarrenal a libertar cortisol e outras hormonas que atuam sobre todo o corpo. Em doses adequadas, o cortisol regula o funcionamento do metabolismo dos açúcares (glicose), das gorduras (lípidos), das proteínas, bem como a formação dos ossos, formação de novas moléculas de sangue, funcionamento intestinal e ainda a fundamental resposta imunitária. Uma quantidade desadequada destas hormonas levará a uma resposta deficiente ou exagerada do nosso sistema imunitário (sistema de defesa do corpo), podendo estar na origem de doenças autoimunes como as artrites ou algumas das mais frequentes doenças da tiroide ou ainda uma maior facilidade em contrair doenças infecciosas. Numa situação de stress/agressão de relativamente curta duração, estas hormonas têm um efeito protetor. Por exemplo, numa situação de perigo em que sentimos o risco de ser atacados por um cão perigoso, o cortisol (e outras hormonas) vão aumentar a atividade do sistema nervoso autonómico, promovendo o aumento da frequência cardíaca, da frequência respiratória, uma maior atividade muscular e a libertação de hormonas com propriedades analgésicas, anti-inflamatórias entre outras, de modo a permitir uma resposta adequada à agressão e reduzir a atividade do estômago e dos intestinos, assim como de outros órgão e funções menos importantes em situações de perigo. É isto que permite fazer uma fuga ou enfrentar a agressão. O problema é se substituirmos esta ameaça eminente, mas temporária (caso do cão feroz) por outra potencialmente menos perigosa, mas mantida ao longo do tempo, como por exemplo um chefe rabugento e desagradável ou filas intermináveis de trânsito que diariamente e durante muito tempo, desencadeiam o mesmo tipo de respostas. Estas não só não serão úteis, como se podem até tornar perigosas a longo prazo, porque vão potenciar o aparecimento de muitas formas de doença em vários órgãos, que colocam o próprio organismo sob ameaça. Numa fase que Hans Seley denominou de fase crónica ou exaustão (após uma fase inicial e outra chamada de adaptação), aparecem então os sinais e sintomas de que estes mecanismos, que são protetores e importantes, se “viraram” contra nós: deixa de existir crescimento nas crianças, o sistema digestivo não funciona adequadamente, surgindo as gastrites e colites entre outras patologias do sistema digestivo. Ao nível cardíaco aumenta a probabilidade de desenvolvermos “tensão alta” (hipertensão arterial), arritmias ou mesmo enfartes cardíacos. No metabolismo dos hidratos de carbono (açucares), pode levar ao aparecimento da Diabetes e entre outros problemas, o excesso crónico de cortisol pode levar ao surgimento de uma depressão. Tanto em homens como em mulheres, o stress crónico interfere, embora de forma diferente, com a sexualidade e fertilidade, levando ao aumento dos efeitos secundários desta patologia do stress que tem muitas caras e formas de apresentação e que numa fase inicial, mas já muito perigosa, apresenta muitos sintomas “psicológicos”, poucas alterações nas análises e outros exames complementares de diagnóstico e que dificilmente se resolve apenas com medicamentos. Assim como se conjugam diversos fatores para que o stress seja uma doença, é necessário lutar com várias “armas” e muita criatividade para derrotar este inimigo silencioso, mas muito PERIGOSO.

Relembro que a consulta desta informação não deve ser entendida como uma consulta médica e se acha que tem estes sintomas ou doença, deve procurar a ajuda do seu médico assistente. No próximo post e em toda esta plataforma, vamos falar muitas vezes, sobre medidas para ajudar a prevenir e a tratar o stress crónico.

Boa saúde a todos.

Jose Santos

josefsantos@docnurse.pt

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