A criança que foi teria orgulho no adulto que é hoje?

Mauro Paulino // Junho 1, 2022
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adulto criança
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Já tinha pensado sobre esta questão? A que resposta chegou?

Existem adultos que associam, ainda que em silêncio, a infância a experiências negativas, algumas até traumáticas. Outros há que acreditam que tiveram uma infância dita “normal” ou até mesmo “boa”, vindo a descobrir, após uma profunda reflexão, que andaram, defensivamente, a iludir-se a si próprios.

A psicóloga alemã Stefanie Stahl escreveu que os que não encontram um lar dentro de si jamais descobrirão um no exterior, como forma de remeter para as influências da infância. É aqui que surge o conhecido conceito de “criança interior”, como a soma das impressões que ficaram em nós da infância, isto é, as boas e as más, que vivemos através da relação com os nossos pais ou outras pessoas importantes para nós.

Apesar dos sonhos e vontades que se tem em criança, nem sempre é possível beneficiar de um lugar tranquilo e securizante, levando a posturas e comportamentos durante a idade adulta que entristeceriam, no mínimo, a criança que se foi.

Os primeiros anos de vida são muito importantes no desenvolvimento humano. 

É durante esse período que a estrutura do cérebro ganha forma e a maneira como a mãe e o pai tratam de nós passa ser o plano, o modelo para todas as nossas relações futuras. Por outras palavras, o vínculo com os nossos pais ensina-nos a olhar para nós e também para os relacionamentos interpessoais.

Em traços simples, podemos identificar como necessidades psicológicas básicas, a necessidade de criar vínculos, de autonomia e segurança, de sentir prazer e de reforçar a autoestima. Ao frustrarmos estas necessidades na infância pela negligência, rejeição e/ou pelo abuso comprometemos um saudável desenvolvimento, podendo entrar-se numa espiral de defesas (por exemplo, reprimir a realidade, sede de poder, agressividade, perfeccionismo, isolamento) ou sintomatologia psicopatológica.

Tais vivências não têm que significar uma condenação eterna à infelicidade, desperdiçando toda a vida adulta. Dependendo das experiências adversas vividas na infância, é possível superar e ressignificar esse passado, de modo que o adulto de hoje conforte a criança interior e a criança que foi tenha orgulho no adulto em que se tornou, apesar das dificuldades pelas quais possa ter passado.

A superação das experiências adversas na infância

Partilho em seguida possíveis estratégias cognitivas e comportamentais que podem ajudar na autogestão e a reescrever memórias antigas e, consequentemente, a iniciar ou retomar a sintonia com a vida, tais como:

  1. Desconstrua as suas certezas negativas, que, na verdade, são consequência das influências da infância. Por exemplo, não era sua responsabilidade, enquanto criança, compreender e satisfazer as necessidades dos seus pais, como se tivesse de se comportar de uma determinada maneira para fazer com que a amassem;
  2. Enquanto adulto, pode definir a atitude e a abordagem que irá adotar perante futuras ocorrências. Questione qualquer relacionamento com base no papel que nele desempenha. Mesmo em contexto terapêutico, quando os clientes esperam assistir passivamente à intervenção psicológica, achando que é o psicólogo a fazer o trabalho todo e consideram esse trabalho como um serviço prestado, os progressos estão bastante condicionados;
  3. Aprenda a dizer que não. Uma das principais questões que as pessoas cuja criança interior se considera fraca enfrenta é a dificuldade em dizer que não, acabando por concordar em fazer favores contra a sua vontade. Com isso, acaba ressentida com a outra pessoa, causando mais prejuízo no relacionamento, do que se tivesse simplesmente dito que não.

A investigação aponta diversos fatores relacionados com as características da própria pessoa (vinculação, coeficiente intelectual, autoestima) e do(s) causador(es) das experiências negativas (quanto maior a relação de proximidade com a criança, maior o risco de impacto), com o suporte do meio (estatuto socioeconómico da área de residência da criança, áreas desportivas, culturais e escolares) e com as características dos eventos adversos (gravidade, frequência, duração) que podem interferir nos efeitos negativos para a saúde.

A mais-valia da ajuda psicológica

Se, por vezes, a superação e ressignificação de que se necessita pode suceder ao longo da vida através do envolvimento noutros relacionamentos saudáveis, é tão ou mais verdade de que em muitos casos há quem necessite de um formato específico de relação, concretamente uma relação terapêutica com psicólogo habilitado para o efeito. Adiar esse pedido de ajuda apenas potencia o sofrimento.

Existem estratégias de intervenção psicológica sustentadas em evidência científica e com clara vantagem de custo-eficácia que visam a resolução das angústias associadas a memórias ou eventos traumáticos, permitindo uma resolução adaptativa com claros benefícios no seu quotidiano. É possível falarmos na diminuição ou eliminação da tensão emocional e no desenvolvimento de cognições positivas que curarão a sua criança interior e permitirão que o seu adulto seja motivo de orgulho, mas também de superação. Vamos a isso?

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