Burnout parental

Tânia Correia // Outubro 13, 2022
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A imagem de pais desgastados física e psicologicamente, pouco seguros das suas competências parentais e da orientação que é dada pelos seus instintos, que se cobram regularmente, tem vindo a proliferar na nossa sociedade. Lamentavelmente, esta imagem vulgarizou-se ao ponto de ser normalizada. 

O aumento do número de papéis que os pais precisam de desempenhar em simultâneo, as expectativas irrealistas definidas pelos próprios e/ou pelos outros, combinados com as visões deturpadas que vão proliferando sobre a parentalidade, criam a imagem inatingível de mãe/pai que sabe sempre como agir e não perde o controlo em nenhum momento. A comparação com essa imagem faz com que mesmo experiências saudáveis de parentalidade pareçam pouco satisfatórias. 

Orientados pela necessidade excessiva de darem aquilo que nunca receberam na infância e simultaneamente marcados pela ausência de um exemplo prático do que é um nível saudável de entrega, alguns pais vivem numa espécie de corrida em que a meta nunca é atingida. 

Na realidade essa meta não existe – por muito que alcancem, não conseguem avaliar se será o suficiente. O medo de as suas crianças sentirem o mesmo que estes sentiram lá atrás faz com que o seu objectivo seja manterem-nas felizes a todo o instante. 

O burnout parental e os quadros de depressão ou ansiedade podem apresentar sintomas comuns, como a falta de energia, as alterações de humor, do sono e/ou do apetite. 

Não obstante, o burnout parental distingue-se por estar direccionado para a sensação de se estar a falhar na educação dos filhos (é mais específico). Evidentemente, ao longo do tempo os efeitos desta patologia podem começar a ser sentidos nas diversas áreas da vida. Por exemplo, sem que haja descanso, o rendimento no trabalho poderá diminuir bastante, criando problemas neste campo. Assim sendo, é possível afirmar que o burnout parental é um factor de risco para o desenvolvimento de outros quadros como os que foram referidos. 

Com o fim de semana, chega a angústia, altura em que se passa mais tempo com os filhos, o desejo constante de que chegue a hora de irem dormir, o alívio por regressar ao trabalho, a avaliação do próprio desempenho em assegurar um nível de felicidade máxima aos filhos, assim como as acções em piloto automático, são alguns dos sinais mais comuns de burnout parental. 

Por existir uma rigidez e um nível de exigência elevados, cada tarefa ou interacção torna-se penosa. A dada altura, assegurar a “felicidade” ininterrupta dos filhos é a maior fonte de infelicidade dos pais. 

A sensação recorrente de fracasso leva os pais, sem que tenham consciência disso, a confirmarem os seus maiores receios. Mais concretamente, a antecipação dessa sensação aliada à exaustão resultam em comportamentos de evitamento que aumentam o problema. Imaginando o caso de uma mãe/um pai que acredita que não será capaz de proporcionar aos filhos uma ida perfeita ao parque, em que tudo corre conforme planeado e em que estes se divertem mais do que nunca, a forma de evitar a sensação de se estar a falhar que daí iria resultar seria permanecer com as crianças em casa. Numa análise racional, é perceptível que a solução (ficar em casa) seria uma fonte de alimento para a crença de não se estar a fazer o suficiente. É neste círculo vicioso que os pais vivem presos. 

Pessoas com maior necessidade de perfeição têm uma probabilidade mais elevada dessa necessidade estar presente na forma como vivem a parentalidade. Isto deixa-as mais susceptíveis a desenvolverem um quadro de burnout

O mesmo se aplica, como foi referido, a pais cujas figuras de vinculação na infância não representaram modelos saudáveis. O ressentimento deixado conduz a comportamentos de compensação para com os filhos sem que exista uma fasquia. 

As baixas competências emocionais dos progenitores são outro factor de risco. Ao terem dificuldade em identificar e expressar aquilo que sentem, irão ter maior dificuldade em regular-se e em lidar com o leque emocional dos filhos, procurando mantê-los na única emoção que consideram ajustada: a alegria. Nestes casos, verifica-se também que muitos dos seus recursos internos são consumidos pelas feridas da sua história de vida, activadas na interacção com a criança, a tentar fugir delas, na tal corrida sem meta. 

Por estes motivos, torna-se fundamental escolhermos, de forma intencional, nos momentos desafiantes para onde iremos canalizar os nossos recursos – se para o problema ou para a solução – através de um olhar flexível e empático connosco. 

A par disso, a porta que nos permite visitar a nossa história precisa de estar aberta ao ponto de conectarmos a criança que permanece em nós com o adulto que vemos ao espelho. 

Muito do nosso bem-estar actual depende do nível de cura da nossa criança interior.

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